quinta-feira, 1 de setembro de 2011

O Sorriso do Gambá

O sorriso do gambá

Luiz C. Rangel

“Bonitão” era um policial rodoviário acima da média, eficiente, caprichoso, atencioso, e,como o apelido sugere, um tanto ao quanto narcisista, admirador de si próprio, e as vezes,dando um valor exagerado a tudo o que lhe pertencia, como por exemplo roupas, calçados,relógios, automóvel e arma. Cuidadoso, mantinha seus objetos sempre em perfeitas condições deuso, principalmente as armas, que estavam invariavelmente em excepcionais condições demanutenção. Certa feita, lá pela década de 70, estando de serviço na ronda de serra, na BR040, Rio-Petrópolis, Bonitão apresentou-se para trabalhar portando um enorme e reluzenterevólver, que sem o menor exagero, possuía um cano de pelo menos uns trinta centímetros, dotadode alça de mira e dispositivo de refrigeração, e, segundo suas palavras, “era o que de melhore mais moderno existia no mercado em matéria de arma de defesa pessoal, coisa importada,caríssima e de dificílima aquisição.
O plantão, exceto pelas “feijoadas” habituais, atéque corria calmo, tanto que lá pelas três da madrugada, a equipe que era composta além deBonitão por “Bolacha” e “Baixinho”, resolveu estacionar a viatura no Belvedere, à época Km.35 da Rodovia do Contorno. Já estavam no local há algum tempo, quando Baixinho avistou iluminado pela claridade da lua, um enorme e belo exemplar de gambá, que parado no jardim fitava atentamente a viatura da PRF. Após um breve bate-papo, o destino do bicho foi selado, ficando decidido que o pobre seria sumariamente executado e serviria de tira gosto para ashabituais “lourinhas” que eram religiosamente consumidas ao final de cada serviço. E mais ainda, como forma de homenagem, teria o privilégio de ser sacrificado pelo super-revólver que Bonitão já chamava de sua mega arma. Anunciando o veredicto, o carrasco desceu da viatura, sacou o trabuco, empunhou com as duas mãos, colocou um pé um pouco à frente, caprichou na pontaria e...ploft... a arma deu chabu. O gambá permaneceu impassível, como que hipnotizado,novos preparativos para o tiro fatal, e pela segunda vez a mega arma negou fogo, e o bicho ali,imóvel, como imóvel permaneceu durante as outras quatro tentativas que se seguiram, não tendo se movido um centímetro sequer. Bonitão, pálido, suando frio, sem graça e totalmente desconcertado, resolveu desistir da execução, e para espanto próprio, dos companheiros de equipe e até do sortudo gambá, ao colocar o “canhão” no coldre, ouviu-se um enorme estrondo, enquanto uma grande língua de fogo saia pelo cano da arma e o projétil penetrava no solo, a menos de dois centímetros do pé do infeliz atirador. A gargalhada foi uníssona, a gozação terrível e impiedosa, com Baixinho jurando que viu o gambá antes de disparar mato a dentro, olhar para Bonitão, esboçar um sarcástico sorriso de deboche, e, erguendo a patinha direita, fazer o clássico e famoso gesto dos quatro dedos encolhidos, e apenas o dedo médio esticado. É mole ou quer mais?

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